Embora pareça não existir relação entre economia e educação à primeira vista, existe uma vinculação estrita entre as duas esferas.
Desde a formação das primeiras sociedades primitivas, a educação sempre esteve subordinada a economia.
Nos primeiros aglomerados humanos, os indivíduos eram treinados conforme as necessidades do grupo, na pesca ou na caça, por exemplo.
Enquanto sociedades, com natureza econômica mais desenvolvida, direcionavam o sistema educacional para suprir estas necessidades.
Uma dinâmica que persiste até hoje, embora constituindo uma relação entre economia e educação mais complexa.
Economia e educação ao longo da história.
Economia e educação sempre estiveram intimamente relacionadas desde os primórdios da história da humanidade e do surgimento das primeiras civilizações.
Entre os gregos, na antiguidade, enquanto Atenas, cidade ligada ao comércio, construiu um sistema educacional voltado ao desenvolvimento intelectual de novos conhecimentos, fazendo inclusive nascer à filosofia.
Em Esparta, cuja principal atividade econômica era o saque de bens acumulados por outros povos, o sistema educacional foi pensado para formar guerreiros.
Do mesmo modo, contemporaneamente, um país predominantemente agrícola ou industrial centraliza sua educação para suprir o setor com a mão de obra adequada.
Uma das poucas tentativas de construir uma educação desvinculada da economia aconteceu durante o Renascimento, entre o século XII e XV.
Foi quando os humanistas propuseram um sistema educacional mais amplo, que possibilitasse uma formação generalista, sem a preocupação com as funções necessárias para suprir a economia.
Os humanistas pensaram uma educação que formasse pessoas em busca de um aprimoramento das capacidades humanas e não necessariamente técnicas ou teóricas.
É importante ressaltar que, até então, embora a grande maioria da população só tinha acesso a uma educação informal.
A educação formal era destinada a uma minoria, somente voltada a constituir a mão de obra necessária ao bom funcionamento da sociedade, fornecendo possibilidades quase nulas de mobilidade social.
Somente com a Revolução Francesa - com seu ideal de igualdade, liberdade e fraternidade -, é que a educação formal começou a ser popularizada, massificada em certo sentido.
A partir deste momento, gradualmente, a educação passou a ser fornecida pelo Estado, de forma publica e gratuita, até porque o conceito de Estado estava ainda em formação.
No entanto, com a Revolução Industrial, a partir do século XVIII, a necessidade de suprir com mão de obra especializada o sistema capitalista, massificou a educação, adequando-a, mais do que nunca, as exigências econômicas.
Na realidade, a afirmação de que o sistema capitalista nasceu com a Revolução Industrial é controversa.
Vários estudos contestam este conceito, alguns até defendem a idéia de que o sistema capitalista já existia desde a antiguidade.
Giovani Arrigui, autor de O longo século XX, defende a idéia de que o sistema capitalista nasceu no século XII, em Genova, com a intermediação de especiarias via mediterrâneo.
Nesta época teria se iniciado com primeiro ciclo de acumulação sistêmica capitalista, um conceito que expressa um período onde pessoas e instituições se capitalizaram, acumularam capital, sendo liderado por uma potência hegemônica.
No caso do século XII, a potência foi justamente Genova, com seus mercadores enriquecidos pelos comercio de especiarias importadas do Oriente, tendo inclusive participado das grandes navegações, no século XV e XVI, como investidores e financiadores das empreitadas.
O segundo ciclo de acumulação sistêmica do capitalismo teria sido iniciado no século XVI, liderado pela Holanda e centrado no transito marítimo de mercadorias, com potencias hegemônicas controlando entrepostos para exercer domínio sobre mercados e zonas produtoras de matéria-prima.
O terceiro ciclo teria sido liderado pela Inglaterra, iniciado no século XVIII, baseado no controle do fluxo naval por meio de uma grande armada de guerra.
O quarto ciclo teria se iniciado no século XX, tendo como potência hegemônica os Estados Unidos da América, quando começou um controle econômico financeiro deste país sobre o mundo, com intervenções armadas em nações que se recusavam a se submeter ao modelo econômico imposto.
Segundo Arrigui, a derrota norte-americana perante o Vietnã, na década de 1980, maçou o fim da hegemonia dos Estados Unidos da América e o surgimento de um novo líder a China, quando o sistema capitalista passou a sofrer um novo reajuste, ainda em movimento, marcando um novo ciclo no século XXI.
Destarte, o século XX, com o fordismo, a especialização das funções intensificou a compartimentação do sistema educacional, indo na contramão do humanismo renascentista, estreitando o vinculo entre economia e educação.
A partir deste momento, a educação ficou totalmente subordinada à economia, em outras palavras, passou a servir inteiramente aos sistemas econômicos.
A educação foi pensada para servir interesses econômicos e não para contribuir para aprimorar a vida em sociedade ou aprimorar a economia.
O sistema educacional passou a ter a obrigação não só de treinar a mão de obra, como também fazer girar a economia, formando mercado consumidor, elevando parcialmente o poder de consumo, através de indivíduos melhor qualificados tecnicamente.
A educação passou a se vista como um investimento econômico que deve gerar retorno para o Estado, servindo a reprodução e manutenção do sistema capitalista vigente.
Educação e desenvolvimento.
O desenvolvimento econômico de um país, dentro do âmbito do sistema capitalista, está estreitamente ligado a educação, uma vez que formadora dos recursos humanos necessários as sistema produtivo que faz a economia girar.
Os recursos humanos de que um país dispõe são formados pela população economicamente ativa e pela população que está sendo preparada para ingresso no mercado de trabalho ou está à espera de vagas.
Em um sentido contemporâneo, excetuando as pessoas que estão ativas ou ainda não ingressaram no mercado de trabalho, o restante forma o que chamamos mão de obra de reserva.
São indivíduos já formados, muitas vezes com experiência prática, mas que, por um motivo ou outro, está fora do mercado de trabalho.
Pensando por este prisma, seria função da educação criar condições para requalificar esta mão de obra, desenvolvendo e ampliando a distribuição de renda.
O sistema educacional deveria criar condições para formar mão de obra que renovasse os quadros, cada vez mais qualificada, para ingresso e recolocação no mercado de trabalho.
Entretanto, o desenvolvimento de um país, teoricamente, envolve não só a capacidade de produção, de atender, criar e aumentar a demanda por produtos; assim como desenvolver novas tecnologias.
Justamente, neste último item, onde entra a contribuição da educação novamente.
Ao formar e requalificar mão de obra, a educação deveria, simultaneamente, desenvolver novas tecnologias e conhecimentos, elevando salários e ampliando o mercado consumidor.
A ampliação de demanda seria criada pela elevação de salários e aumento da população economicamente ativa, criando um circulo virtuoso de abertura de novos postos de trabalho e maior demanda continuamente.
Ao mesmo tempo, ao lançar no mercado mais pessoas melhor preparadas, a educação deveria estimular a população economicamente ativa a buscar se aprimorar para se manter no mercado.
O que estimularia um ambiente de constante busca pelo conhecimento, possibilitando o surgimento de novas tecnologias.
No entanto, na prática, no Brasil não é assim que a economia funciona.
A ampliação do acesso a educação atende um projeto político e não econômico, que seria o correto.
No Brasil, a ampliação do acesso a educação não é acompanhada da manutenção da qualidade, entre outros fatores, conduzindo a formação de uma mão de obra barata, a qual substitui a mais qualificada para reduzir custos.
Uma dinâmica que cria um verdadeiro exército de reserva, baixando o nível salarial e desaquecendo a economia, já que reduz a demanda.
Esta redução de demanda é necessária, do ponto de vista governamental, porque não existe capacidade produtiva capaz de suprir o mercado com produtos no volume adequado, caso houvesse ampliação da renda e da demanda.
Porém, revela grande falta de planejamento governamental, pois terminando diminuindo a capacidade produtiva e o desenvolvimento tecnológico.
O circulo de desenvolvimento econômico brasileiro está invertido.
Mesmo com parte da população economicamente ativa, inserida no mercado de trabalho, sendo substituída por novos ingressantes que são formados continuamente pelo sistema educacional; boa parte dos recém formados não encontram uma colocação.
O mercado de trabalho não tem capacidade para absorver esta mão de obra no seu todo, tanto do ponto de vista daquele que tenta ingressar inicialmente, como daquele que buscou requalificação através da educação.
Uma das razões, além de um circulo vicioso, é que o sistema educacional brasileiro não dá conta de preparar para o mercado de trabalho, com efeitos negativos em todos os setores.
Neste sentido, a educação contribui muito pouco para o desenvolvimento econômico brasileiro, constituindo mero instrumento formador de mão de obra barata de reserva.
Existe uma disparidade entre o conhecimento fornecido pelo sistema educacional e as reais necessidades do sistema produtivo.
A educação no Brasil é extremamente academicista, desatualizada e dirigida e exercida por profissionais com baixa qualificação e preparo.
Na realidade, os baixos salários dos professores conduzem os bons profissionais, educadores por vocação, desistirem da área, deixando, na maior parte das vezes, as escolas entregues aos docentes de meio expediente, aqueles que enxergam na educação o que chamamos “bico”.
É a típica postura do profissional de área distante da educação que, para complementar sua renda, leciona nas horas vagas em uma escola de ensino fundamental e médio, chegando ao extremo de no ensino superior, dependendo do curso, ser esta uma regra.
O Brasil precisa de mais educadores e menos professores, precisa de mais profissionais da educação eu vivem apenas do seu trabalho na área.
Além deste componente, o desenvolvimento tecnológico mundial cada vez mais acelerado, em um mundo globalizado, faz o sistema educacional brasileiro parecer burocrático ao extremo, não acompanhando as necessidades do mercado de trabalho.
O que criou uma situação em que, em meio ao amplo desemprego, faltem profissionais qualificados em alguns setores, obrigando empresas a importar mão de obra e tentar elas próprias qualificar seus funcionários.
Este é um problema antigo no Brasil, remontando ao inicio da industrialização tardia na década de 1930, para os quais já se tentaram inúmeras soluções, todas fracassadas, já que não atacaram a raiz do problema: romper com um círculo econômico invertido.
Para tentar resolver este problema, desde a década de 1970, medidas governamentais recomendaram o incremento do ensino técnico.
Foi quando o IV Encontro de Secretários da Educação e Representantes de Conselhos de Educação, em 1973, fez a recomendação inicial, ressaltando que seria necessário criar intercâmbios com indústrias e universidades.
No entanto, a criação de cursos técnicos, vinculados com o ensino médio, não foi capaz de fazer o Brasil avançar no desenvolvimento econômico.
A maioria dos cursos técnicos nunca se tornaram operacionais, não fornecendo formação prática adequada.
Mesmo quando isto se fez possível, o número restrito de vagas não garantiu a satisfação da demanda no mercado de trabalho.
Na realidade, o tecnicismo educacional não fez mais que ampliar a formação de mão de obra barata, reduzindo o padrão de qualidade nas instituições de nível superior.
Educação e finanças públicas.
As finanças públicas consistem em estudos econômicos, realizados pelo governo (Estado), visando organizar as receitas para atenderem as despesas, teoricamente, buscando um equilíbrio no crédito.
Para organizar as finanças públicas, o Poder Executivo (presidente da República, governadores e prefeitos) elabora um orçamento, estimando a receita e fixando despesas, dentro de um intervalo de tempo denominado exercício fiscal.
Trata-se de uma estimativa porque a receita está baseada naquilo que se espera arrecadar com impostos.
O poder legislativo (senadores, deputados e vereadores) discuti a proposta, altera e aprova o orçamento, transformando em lei.
É interessante ressaltar que o orçamento público coordena as finanças do governo em âmbito federal, estadual e municipal; estabelecendo prioridades e seguindo diretrizes de contabilidade e administração.
Os gatos com educação fazem parte deste orçamento determinado pelas finanças públicas, fixado a partir de uma distribuição de recursos.
Esta distribuição considera inúmeros fatores, tal como a legislação, as políticas publicas, as diretrizes educacionais, econômicas, financeiras e sociais.
A despeito do projeto político partidário de quem está no poder condicionar todos os outros fatores.
Está fixado neste ponto um dos grandes problemas do orçamento destinado a educação no Brasil.
O sistema educacional é sempre pensado por políticos e não por especialistas em educação, fazendo as reais necessidades do sistema educacional não serem atendidas.
O orçamento da educação.
Os objetivos e diretrizes do sistema educacional são expressos, em termos financeiros, através do orçamento da educação, onde receitas e despesas são consideradas para organizar o exercício fiscal.
Neste sentido, ao menos teoricamente, o orçamento da educação leva em consideração:
1. Objetivos gerais e específicos de cada departamento, divisão, setor, escola, curso, turma, etc.
2. A situação atual e as necessidades de modificação, conforme seu funcionamento na prática, como por exemplo, os recursos técnicos disponíveis e sua qualidade e real disponibilidade de aplicação.
3. A articulação do trabalho a ser desenvolvido em cada ano fiscal e os planos de alcance mais amplo; como por exemplo, a necessidade de ampliação da rede escolar e a contratação de novos professores para atender esta ampliação.
A questão é que, mesmo admitindo que na prática exista um planejamento adequado, a valorização do professor como profissional altamente especializado e que necessita de constante reciclagem, através de uma política salarial adequada, em raras ocasiões acontece.
Destarte, para facilitar a elaboração de um orçamento da educação, cada setor colabora para classificar as despesas, encaixando-as em categorias, possibilitando a visualização dos investimentos necessários para manutenção e custeio dos serviços educacionais.
Em linhas gerais, a classificação das despesas envolveria categorias, tais como:
1. Material Permanente: móveis, equipamentos, construções, ampliações, etc.
2. Material de Consumo: material escolar, de limpeza, alimentos, uniformes, etc.
3. Despesas com Pessoal: salários e encargos sociais.
4. Outros Serviços e Encargos: serviços prestados por terceiros.
Outra questão se considerar, no orçamento da educação, é o fato do planejamento funcionar ao inverso do que procederia um cidadão para planejar seus gastos.
Primeiro estima-se as despesas, para, posteriormente, analisar as necessidades a serem atendidas e a ordem de prioridade.
Devido à importância que a educação tem para sociedade, existe uma legislação que determina cotas no orçamento geral, obrigando a aplicação no sistema educacional.
A Constituição de 1988, estabelece, na seção I, do Capítulo III, Título VIII:
Artigo 211: “A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios organizarão em regime de colaboração seus sistemas de ensino”.
1º. “A União organizará e financiará o sistema federal de ensino e dos territórios e prestará assistência técnica e financeira aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios para o desenvolvimento de seus sistemas de ensino e o atendimento prioritário à escolaridade obrigatória”.
2º. “Os municípios atuarão prioritariamente no ensino fundamental e pré-escolar”.
Artigo 212: “A União aplicará, anualmente, nunca menos que dezoito, e os Estados, Distrito Federal e os Municípios vinte e cinco por cento, no mínimo, da receita resultante de impostos (...) na manutenção e desenvolvimento do ensino”.
É interessante ressaltar que o parágrafo 4º. do Artigo 212, determina que não podem ser computados, nestas porcentagens de gatos, programas suplementares de alimentação9 e assistência a saúde.
É também interessante ressaltar que escolas particulares também podem receber verbas publicas, desde que enquadradas como comunitárias, confessionais ou filantrópicas.
Para isto, devem comprovar finalidade não lucrativa e aplicação de excedente financeiro em educação.
Na prática, enquanto os municípios estão obrigados a investir prioritariamente no ensino fundamental e pré-escolar, os Estados devem cuidar do ensino médio e a União das universidades e escolas técnicas.
Porém, os recursos são insuficientes para romper com o ciclo econômico invertido e deturpado brasileiro, os recursos humanos, os professores, não possuem a necessária e merecida valorização orçamentária.
Concluindo.
Para além dos problemas conjunturais, devemos ressaltar que, apesar da legislação determinar percentuais mínimos para aplicação de recursos em educação, não regula a otimização, que fica a cargo do administrador escolar.
Não são contabilizados nos percentuais os recursos transferidos pela União aos Estados, ou dos Estados para os Municípios.
O ajuste entre despesas e receitas, para atender os percentuais fixados anualmente pela Constituição, deve ser apurado a cada trimestre do exercício financeiro e corrigido.
Pela lei, o repasse dos valores da União, dos Estados e Municípios deveria ocorrer imediatamente ao órgão responsável pela educação, sempre com um intervalo máximo de 20 dias entre a arrecadação e o repasse.
O atraso implica em correção monetária e responsabilização civil e criminal das autoridades competentes.
As leis são muito bonitas, mas, na verdade, a corrupção e a burocracia imperam todo o processo.
Para mudar a educação no Brasil é preciso alterar a ótica de pensamento e reformular as políticas públicas pensadas também no âmbito econômico.
Para saber mais sobre o assunto.
ARRIGUI, G. O longo século XX. São Paulo: UNESP, 1996.
BRANDÃO, C. F. “O financiamento da Educação Brasileira” In: Estrutura e Funcionamento do Ensino. São Paulo: Avercamp, 2004. p.92-99.
DOWBOR, L. Aspectos Econômicos da Educação. São Paulo: Ática, 1991.
FERNANDEZ ENGUITA, M. A Face Oculta da Escola: Educação e Trabalho no Currículo. Porto Alegre: Artes Médicas, 1989.
FERRETTI, C. J. Trabalho, Formação e Currículo: Para Onde Vai a Escola? São Paulo: Xama, 1999.
MARTINS, J. P. “Economia e Finanças da Educação” In: Administração Escolar- uma abordagem crítica do processo administrativo em Educação. São Paulo: Editora Atlas, 1999. p.81-91.
RAMOS, Fábio Pestana. No tempo das especiarias: o império da pimenta e do açúcar. São Paulo: Contexto, 2004.
Texto: Prof. Dr. Fábio Pestana Ramos.
Doutor em História Social pela FFLCH/USP.
(fonte: http://fabiopestanaramos.blogspot.com.br/2011/04/fundamentos-economicos-da-educacao.html)
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