quarta-feira, setembro 06, 2017

A Importância do Desenho Infantil no Processo de Alfabetização


Autor: Alcione Vieira de Paiva e Luana Carolina Rodrigues Cardoso

Data: 26/08/2010

Resumo
Este artigo foi elaborado no segundo semestre de 2009, como pré-requisito para a obtenção do título de Especialista "Lato Sensu" em Educação Infantil, pelo Centro de Pesquisas Educacionais de Minas Gerais, CEPEMG. Abordou a importância do desenho infantil no processo de alfabetização. Os objetivos foram analisar os estágios de evolução do desenho infantil; revisar bibliografia sobre o tema e identificar a influência do desenho infantil na aquisição da escrita por crianças na faixa etária de dois a sete anos.

Introdução
Este trabalho foi motivado pelo desejo das autoras de identificar as contribuições do desenho infantil no processo na aquisição da escrita por crianças na faixa etária de dois a sete anos. Buscou-se reunir e revisar a bibliografia sobre estudos de alguns teóricos traçando um breve panorama sobre o assunto. Foram objetivos desse trabalho: analisar os estágios de evolução do desenho infantil; revisar bibliografia sobre o tema e compreender como o desenho infantil influencia no processo de alfabetização.
Muitas crianças ao chegarem ao 1º ano do ensino fundamental apresentam dificuldades de aprendizagem relacionadas à escrita. É possível que estas crianças não tenham tido oportunidades significativas de interação na educação infantil, fase na qual se desenvolve a função simbólica e consequentemente os sistemas de representação, fato que pode ter prejudicado o desenvolvimento da criança. Em situações como esta, é perceptível a importância do trabalho na educação infantil que priorize e preserve os momentos lúdicos e prazerosos, que certamente contribuirão para o desenvolvimento do desenho infantil.
Ao final do seu primeiro ano de vida, que compreende o estágio sensório-motor, descrito por Piaget (1948), a criança é capaz de manter ritmos regulares e produzir seus primeiros traços gráficos. O desenvolvimento progressivo do desenho implica mudanças significativas que, no início, dizem respeito à passagem dos rabiscos iniciais da garatuja para construções cada vez mais ordenadas, fazendo surgir os primeiros símbolos. De acordo com o mesmo autor, a função semiótica é a capacidade que a criança tem de representar objetos ou situações que estão fora do seu campo visual por meio de imagens mentais, de desenhos, da linguagem. A criança passa a desenvolver essa função no estágio pré-operatório, que compreende faixa etária de dois a sete anos.
As crianças no início dessa fase começam a representar na tentativa de interagir com o mundo que a cerca, desenvolvendo a função simbólica, entendida como ato de representação, possibilita à criança, de acordo com Ribeiro (2007) "[...] à tomada de consciência da organização do mundo e o entendimento de fatos passados, presentes e futuros [...]". Sendo assim, entende-se que a representação é requisito básico para as operações mentais.
O que constitui a função semiótica e o que a faz ultrapassar a atividade sensório-motora é a capacidade de representar um objeto ausente, por meio de símbolos ou signos, o que implica poder diferenciar e coordenar os significantes e os significados ao mesmo tempo. (PILLAR, 1996, p.26)
A cada representação que a criança faz, o jogo simbólico e o desenho passam a ser uma necessidade, e é assim que elas vão se inserindo no processo de alfabetização, desde o estágio pré-operatório, onde se inicia o processo de representação, interagindo com a escrita como se a mesma fosse um jogo que contêm regras e, contêm também o imaginário. Dessa forma a escrita deixa de ser uma representação mental e passa a ser uma representação gráfica, carregada de sentidos, assim como o desenho que, primeiro passa pelo plano da representação mental e só depois a criança passa a representá-lo graficamente. Assim o desenho infantil pode ser considerado precursor da escrita, estando diretamente relacionado ao processo de alfabetização.

1. Pressupostos Teóricos
Os primeiros estudos sobre desenho das crianças datam do final do século XIX e estão fundados nas concepções psicológicas e estéticas da época.  São os psicólogos e os artistas que descobrem a originalidade dos desenhos infantis e publicam as primeiras 'notas' e 'observações' sobre o assunto. Como escreveu o famoso pintor Pablo Picasso em relação às suas observações sobre o desenho infantil: Quando criança, eu desenhava como Rafael. À medida que fiquei mais velho, passei a desenhar como criança.
De certa forma eles transpuseram para o domínio do grafismo a descoberta fundamental de Jean Jacques Rousseau sobre a maneira própria de ver e de pensar da criança. As concepções relativas a infância modificaram-se progressivamente. A descoberta de leis próprias da psique infantil, a demonstração da originalidade de seu desenvolvimento, levaram a admitir a especificidade desse universo.
Piaget (1948) diz que a representação é gerada pela função semiótica, a qual possibilita à criança reconstruir em pensamento um objeto ausente por meio de um símbolo ou signo. A representação é condição básica para o pensamento existir, uma vez que, sem ela, não há pensamento, só inteligência puramente vivida como no nível sensório-motor. É através do surgimento da função semiótica que a criança consegue evocar e reconstruir em pensamento ações passadas e relacioná-las com as ações atuais. Essa passagem é possível por interações da criança com o ato de desenhar e com desenhos de outras pessoas. Na garatuja, a criança tem como hipótese que o desenho é simplesmente uma ação sobre uma superfície, e ela sente prazer ao constatar os efeitos visuais que essa ação produziu. No decorrer do tempo, as garatujas, que refletiam o prolongamento de movimentos rítmicos de ir e vir transformam-se em formas definidas que apresentam maior ordenação, e podem estar se referindo a objetos naturais, objetos imaginários ou mesmo a outros desenhos. Na evolução da garatuja para o desenho de formas mais estruturadas, a criança desenvolve a intenção de elaborar imagens no fazer artístico. Começando com símbolos muito simples, ela passa a articulá-los no espaço do papel, na areia, na parede ou em qualquer outra superfície.
Passa também a constatar a regularidade nos desenhos presentes no meio ambiente e nos trabalhos aos quais ela tem acesso, incorporando esse conhecimento em suas próprias produções. No início, a criança trabalha sobre a hipótese de que o desenho serve para imprimir tudo o que ela sabe sobre o mundo. No decorrer da simbolização, a criança incorpora progressivamente regularidades ou códigos de representação das imagens do entorno, passando a considerar a hipótese de que o desenho serve para imprimir o que se vê.
É assim que, por meio do desenho, a criança cria e recria individualmente formas expressivas, integrando percepção, imaginação, reflexão e sensibilidade, que podem então ser apropriadas pelas leituras simbólicas de outras crianças e adultos.
O desenho como possibilidade de brincar, o desenho como possibilidade de falar de registrar, marca o desenvolvimento da infância, porém em cada estágio, o desenho assume um caráter próprio. Estes estágios definem maneiras de desenhar que são bastante similares em todas as crianças, apesar das diferenças individuais de temperamento e sensibilidade. Esta maneira de desenhar própria de cada idade varia, inclusive, muito pouco de cultura para cultura.
Pillar (2006) afirma que a criança não nasce sabendo desenhar, que este conhecimento é construído a partir da sua relação direta com o objeto, assim são suas estruturas mentais é que definem as suas possibilidades quanto a representação e interpretação do objeto. Assim a criança é o sujeito de seu processo, ela aprende a desenhar a partir de sua interação com o desenho. Vários teóricos seguem essa linha teórica quanto ao desenho infantil, dentre eles Luquet(1969), Piaget (1948), Gardner(1999), Méredieu (1995) dentre outros.
Luquet (1969) foi um dos primeiros teóricos a se interessar pelo desenho infantil, analisando-o numa abordagem cognitiva. O autor buscou respostas para questões relativas o quê e como a criança desenhava, assim como suas intenções e interpretações. Aborda os 'erros' e 'imperfeições' do desenho da criança que atribui a 'inabilidade' e 'falta de atenção', além de afirmar que existe uma tendência natural e voluntária da criança para o realismo.
Em Méredieu(1995), Luquet distingue quatro estágios do desenho infantil: o Realismo fortuito: começa por volta dos 2 anos e põe fim ao período chamado rabisco. A criança que começou por traçar signos sem desejo de representação descobre por acaso uma analogia com um objeto e o seu traçado passa a nomear seu desenho; Realismo fracassado: por volta dos 3 a 4 anos tendo descoberto a identidade forma-objeto, a criança procura reproduzir esta forma. Surge então uma fase de aprendizagem pontuada de fracassos e de sucessos parciais; Realismo intelectual: estendendo-se dos 4 aos 10-12 anos, é o principal estágio e caracteriza-se pelo fato que a criança desenha do objeto não aquilo que vê, mas aquilo que sabe.
Enfim, aos quatro anos, a criança chega ao realismo visual cuja principal manifestação é a submissão mais ou menos infeliz na execução à perspectiva. (Luquet, 1969, p.212)
 A análise dos estudos piagetianos mostram que o desenvolvimento do desenho segue os mesmos estágios de Luquet (1969), no entanto são analisados dentro da perspectiva das fases do desenvolvimento infantil da representação. Piaget classifica as fases do desenho como:
  • Garatuja: Faz parte da fase sensório motora (0 a 2 anos) e parte da fase pré-operatória (2 a 7 anos). A criança demonstra extremo prazer nesta fase. A figura humana é inexistente ou pode aparecer da maneira imaginária. A cor tem um papel secundário, aparecendo o interesse pelo contraste, mas não há intenção consciente. A fase da garatuja pode ser dividida em outras duas partes:
  • Desordenada: movimentos amplos e desordenados. Com relação a expressão, vemos a imitação "eu imito, porém não represento". Ainda é um exercício, simples riscos ainda desprovidos de controle motor, a criança ignora os limites do papel e mexa todo o corpo para desenhar, avançando os traçados pelas paredes e chão. As primeiras garatujas são linhas longitudinais que, com o tempo, vão se tornando circulares e, por fim, se fecham em formas independentes, que ficam soltas na página. No final dessa fase, é possível que surjam os primeiros indícios de figuras humanas, como cabeças com olhos.
  • Ordenada: movimentos longitudinais e circulares; coordenação viso-motora. A figura humana pode aparecer de maneira imaginária, pois aqui existe a exploração do traçado; interesse pelas formas.
    Nessa fase inicia-se o jogo simbólico: "eu represento sozinho". Ocorre a mudança de movimentos; formas irreconhecíveis com significado; atribui nomes, conta histórias. A figura humana pode aparecer de maneira imaginária, aparecem sóis, radiais e mandalas. Dentro da fase pré-operatória, aparece a descoberta da relação entre desenho, pensamento e realidade. Quanto ao espaço, os desenhos são dispersos inicialmente, não relaciona entre si. Então aparecem as primeiras relações espaciais, surgindo devido à vínculos emocionais. A figura humana torna-se uma procura de um conceito que depende do seu conhecimento ativo, inicia a mudança de símbolos. Quanto a utilização das cores, pode usar, mas não há relação ainda com a realidade, dependerá do interesse emocional. Dentro da expressão, o jogo simbólico aparece como: "nós representamos juntos". Já conquistou a forma e seus desenhos têm a intenção de reproduzir algo. Ela também respeita melhor os limites do papel. Mas o grande salto é ser capaz de desenhar um ser humano reconhecível, com pernas, braços, pescoço e tronco.
    De acordo com Piaget (1948), no estágio pré-esquemático, que inicia-se por volta dos quatro anos e se estende até os sete anos. Após esta fase a criança com idade entre sete e nove anos entra no estágio esquemático, e após os nove anos passa para o estágio do realismo nascente, vale ressaltar que estes estágios compreendidos entre os sete e onze anos estão dentro do período das operações concretas. Estes estágios não são estáticos, imutáveis, existem crianças que pulam alguns estágios de desenvolvimento e  crianças que param de se desenvolver devido a vários fatores que influenciam em sua vida, como deficiências física ou mental, como família, situação social e econômica ou distúrbios psicológicos.
    Gardner(1999) faz uma abordagem cognitiva baseada em Piaget, e uma análise afetiva, baseada em sistemas de simbolização. Este autor considera que o desenvolvimento do desenho infantil, divide-se em quatro movimentos. São movimentos que mantêm sua essência, sendo maleáveis e modificando-se mediante as intervenções externas, ou seja, pelo meio sócio-cultural, pela família e pelo educador. Há necessidade de que haja uma compreensão desses quatro movimentos e de tudo que os envolvem porque cada um tem sua beleza e significação. Estudá-los é estar se fundamentando para poder fazer uma boa leitura da expressão artística da criança.

2. O desenho e o processo de alfabetização
A partir dos estudos realizados é possível dizer que existe uma estreita relação entre a evolução da escrita e a do desenho. Para Ferreiro citada por Ribeiro (2007) a aprendizagem da língua escrita á a construção de um sistema de representação, assim como o desenho. A aprendizagem, nesse enfoque, converte-se na apropriação de um novo objeto de conhecimento, ou seja, em uma aprendizagem conceitual. [...] para conhecer os objetos, é preciso agir sobre eles de maneira a decompô-los e a recompô-los. (PIAGET, 1948, p.8)
[...] para que a criança se aproprie do sistema de representação da escrita, ela terá que reconstruí-lo, diferenciando os elementos e as relações próprias ao sistema, bem como a natureza do vínculo entre o objeto de conhecimento e a sua representação. (PILLAR, 1996, p.32)
As pesquisas realizadas por Emília Ferreiro indicam que cada sujeito, no processo de construção da escrita, parece refazer o caminho percorrido pela humanidade, qual seja: Pictográfica: forma de escrita mais antiga que permitia representar só os objetos que podiam ser desenhados: desenho do próprio objeto para representar a palavra solicitada. Ideográfica: consistia no uso de um simples sinal ou marca para representar uma palavra ou conceito: uso de símbolos diferentes para representar palavras diferentes. Logográfica: escrita constituída por desenhos, referentes ao nome dos objetos e não ao objeto em si.
Assim como as primeiras civilizações faziam inscrições na pedra e a "escrita" representava o próprio objeto, para Ferreiro citada por Ribeiro (2007), a criança associa o significante ao significado. Sendo assim, considerando a escrita como sistema de representação, a autora observa que [...] quando uma criança começa a escrever, produz traços visíveis sobre o papel, e além disso, e fundamentalmente, põe em jogo suas hipóteses acerca do significado mesmo da representação gráfica. (RIBEIRO, 2007,p. 40)
Na pesquisa realizada por Emília Ferreiro e Ana teberosky (1999) sobre a aquisição do sistema de escrita, concluiu que havia níveis nesse desenvolvimento. Os níveis descritos pelas autoras são: pré-silábico, silábico, silábico-alfabético e alfabético.
O nível Pré-silábico I, em m que a criança acredita que escrever é reproduzir ou imitar os traços da escrita do adulto. Nesta etapa a criança pode ter a intenção de produzir marcas diferenciando desenhos de letras ou outros códigos, mas sua escrita ainda não pode funcionar como um veículo informativo.e Pré-silábico II. Se a forma básica de escrita que a criança tem contato for letra de imprensa, fará rabiscos separados, com linhas retas e curvas; se for letra cursiva fará rabiscos ondulados.
No nível pré-silábico II a criança já usa letras ou criam pseudoletras, quando ainda não dominam as letras convencionais do nosso alfabeto para escreverem algo. A criança pensa que é possível ler nomes diferentes com grafias iguais; Posteriormente a criança  nega esta sua hipótese, porque acredita que, para ler nomes diferentes, eles devem ser escritos com letras diferentes.
Ainda de acordo com Ferreiro e Teberosky (1999), a criança passa por uma fase em que ocorre o que denomina eixo quantitativo da escrita. A criança, de um modo geral, exige um mínimo de três letras para o escrito ser uma palavra. As palavras como pé, sol, rua, lar e outras, segundo ela não poderão ser lidas porque tem poucas letras. São rejeitadas, em função do critério interno de quantidade. O adulto que, normalmente, lê artigos, preposições, conjunções e outros, jamais suspeitariam desse critério que a criança utiliza. Daí a ênfase de Emília Ferreiro no sentido de que o processo de alfabetização tem que ser visto do ponto de vista de quem aprende (aluno) e não daquele que ensina (professor).
Segundo as autoras, a criança pode vir a passar por momentos onde afirmam que para que se possa ler ou escrever uma palavra, torna-se necessário, também, variedade de caracteres gráficos. As palavras que possuem letras iguais são também rejeitadas. A criança acredita que "não servem para ler". De acordo com este critério de variedade, para possibilitar a leitura, é preciso haver letras variadas nas palavras.
Outro ponto a ressaltar, é que numa determinada fase, a criança não separa letras de números. Costuma, às vezes, escrever colocando numerais junto às letras, já que ambos envolvem linhas retas e curvas. A característica observada é que a criança acredita que os nomes das pessoas, animais ou objetos devem ter nomes grandes. Por conseguinte, as coisas pequenas terão nomes pequenos. É o que chamamos de realismo nominal lógico.
Posteriormente as formas gráficas adquirem maior proximidade com as letras convencionais. As crianças interagem com outros sistemas notacionais, como por exemplo, os números fazendo distinção entre os símbolos (letras) que são usadas na escrita de outras formas de produção (desenhos, números, placas e outros).
No nível silábico, a  criança começa a escrever como uma produção controlada pela segmentação silábica da palavra. A escrita neste nível constitui um grande avanço e se traduz num dos mais importantes e esquemas construídos pela criança, durante o seu desenvolvimento. Pela primeira vez, ela trabalha com a hipótese de que a escrita representada partes sonoras da fala, porém uma particularidade: cada letra vale por uma sílaba. Assim, utiliza tantas letras quanto forem as sílabas das palavras. Ao trabalhar a escrita silábica, as exigências de variedade e de quantidade mínima de caracteres que aparecem na escrita pré-silábica, podem desaparecer momentaneamente.
Mas se a criança já tiver internalizado a hipótese silábica, a exigência na variedade de caracteres reaparece, pois a criança não aceita que uma palavra poderá ser lida com todas as letras iguais, e o problema se agrava quando a palavra a ser escrita seja um monossílabo. A criança não aceita que uma palavra com menos de três de letras possa ser lida, e então na tentativa de que se possa ler o que ela escreveu, acrescenta-se letras ao final da palavra. E a partir disso, surge um conflito cognitivo por causa da exigência de quantidade mínima de caracteres e a criança tenta buscar outra solução para o seu "problema".
No nível Silábico Alfabético, a passagem da hipótese silábica para a alfabética é um passo de extrema importância na evolução da leitura e da escrita. De acordo com Ferreiro e Teberosky (1999) a criança abandona a hipótese silábica e descobre a necessidade de fazer uma análise, que vá "mais além" da sílaba, pelo conflito entre a hipótese silábica e a exigência mínima de caracteres e o conflito entre a variedade interna das letras.
A criança percebe a insuficiência de sua hipótese ao associar uma letra para cada sílaba e passa a perceber a sílaba constituída com mais de uma letra. Pode-se explicar a passagem do nível silábico para o silábico-alfabético, quando a própria criança não consegue ler o que escreveu, pois faltam elementos para que se faça a leitura, e quando os adultos não conseguem ler o que a criança escreveu. Outro fator que também explica essa passagem é impossibilidade de ler o que as pessoas alfabéticas escrevem, pois as crianças acham que sempre está sobrando letras e então ela entra em conflito, pois sabem que nos livros e nas escritas das pessoas alfabetizadas, o que está escrito, está correto.
A fase final do processo de alfabetização de um indivíduo é marcada pelo Nível Alfabético, segundo Ferreiro e Teberosky (1999). Nesse nível, pode-se considerar que a criança venceu as barreiras do sistema de representação da linguagem escrita. Ela já é capaz de fazer uma análise sonora dos fonemas das palavras que escreve. Isso, porém não significa que todas as dificuldades foram vencidas. A partir daí, surgirão os problemas relativos à ortografia. Entretanto, trata-se de outro tipo de dificuldade que não corresponde ao sistema de escrita que ela já venceu.
De acordo com a pesquisa realizada por Ferreiro e Teberosky (1999), constatou-se que a apropriação do sistema de escrita passa pela reconstrução deste objeto de conhecimento, onde o sujeito cria os elementos e as relações que compõem este sistema de representação. Nesta reconstrução, o sistema alfabético de escrita é uma das representações da linguagem e não uma representação gráfica dos sons da fala.

3.Práticas na educação

No que diz respeito ao trabalho desenvolvido nas escolas em relação ao desenho, principalmente nas séries iniciais do ensino fundamental, é certo descaso com a disciplina que mais trabalha esse conteúdo a Artes como parte integrante do currículo e da formação das crianças. Os professores, em sua maioria, acreditam que o desenho nessa fase escolar não é importante e por esse motivo não planejam o trabalho envolvendo a arte em sala de aula. Mas o que foi observado durante o estudo sobre o desenho infantil e suas contribuições no processo de alfabetização, é que a arte é importante não só porque é uma forma de construir conhecimentos, é uma atividade que envolve a inteligência, o pensamento, a cognição; mas também que a arte influi na construção de conhecimentos, em especial em relação à escrita.
Luquet(1969) exemplifica como se dá o abandono da criança pela atividade do desenho, conforme sua teoria, esse desinteresse é produzido na idade em que a criança chega à concepção do realismo visual - com a sua conseqüência fundamental: a perspectiva; os desenhos que executava anteriormente de acordo com o realismo intelectual já não satisfazem o seu espírito crítico desenvolvido, e sente-se incapaz de fazer desenhos como quereria fazer. O autor afirma que o ensino do desenho deve visar não a acelerar artificialmente a evolução espontânea do desenho, mas por a criança em estado de desenhar convenientemente em realismo visual quando tenha esta intenção. Isso deve ser feito mostrando-lhes objetos de seu quotidiano e exercitando o desenho tanto quanto possível ao natural.    
Para este autor, a principal atitude do educador deve ser a de "apagar-se", deixar a criança use a sua criatividade, fazendo sempre com que estas sugestões não soem como imposições deixando-a desenhar ao seu modo, sem intervenções ou críticas.    A princípio, para a criança, o desenho não é um traçado executado para fazer uma imagem mas um traçado executado simplesmente para fazer linhas. (Luquet, 1969 pg.145)
Dessa forma, possibilitar às crianças que desenhem, ao contrário de ser perda de tempo, é propiciar-lhes representar graficamente as suas experiências, ou seja, é construir representações de forma e espaço através do desenho.
O desenho está também intimamente ligado com o desenvolvimento da escrita. Parte atraente do universo adulto, dotada de prestigio por ser "secreta", a escrita exerce uma verdadeira fascinação sobre a criança, e isso bem antes de ela própria poder traçar verdadeiros signos. Muito cedo ela tenta imitar a escrita dos adultos. Porém, mais tarde, quando ingressa na escola verifica-se uma diminuição da produção gráfica, já que a escrita (considerada mais importante) passa a ser concorrente do desenho.
No entanto, cabe ao professor estudar e conhecer as fases do desenho infantil e qual a relação que elas têm com os níveis de desenvolvimento da escrita, para que assim ele possa proporcionar aos alunos aulas que contribuíram tanto para o desenvolvimento artístico como o desenvolvimento do processo de aquisição da escrita. É aconselhável, ao professor, que ofereça às crianças o contato com diferentes tipos de desenhos e obras de artes, que elas façam a leitura de suas produções e escutem a de outros e também que sugira a criança desenhar a partir de observações diversas (cenas, objetos, pessoas) para que possamos ajudá-la a nutrisse de informações e enriquecer o seu grafismo. Assim elas poderão reformular suas idéias e construir novos conhecimentos. Enfim, o desenho infantil é um universo cheio de mundos a serem explorados.
O desenho está também intimamente ligado com o desenvolvimento da escrita. Parte atraente do universo adulto, dotada de prestigio por ser "secreta", a escrita exerce uma verdadeira fascinação sobre a criança, e isso bem antes de ela própria poder traçar verdadeiros signos. Muito cedo ela tenta imitar a escrita dos adultos. Porém, mais tarde, quando ingressa na escola verifica-se uma diminuição da produção gráfica, já que a escrita (considerada mais importante) passa a ser concorrente do desenho.
Como podemos perceber a linha de evolução é similar mudando com maior ênfase o enfoque em alguns aspectos. O importante é respeitar os ritmos de cada criança e permitir que ela possa desenhar livremente, sem intervenção direta, explorando diversos materiais, suportes e situações.

Considerações Finais
Partindo da pesquisa bibliográfica sobre o desenho infantil, observamos que embora a abordagem e a nomenclatura usada variem, não existem divergências entre os autores no que diz respeito ao desenho infantil sendo que este é notadamente, composto por fases, etapas, estágios, movimentos, qualquer que seja a nomenclatura usada para definir que o desenho evolui conforme o próprio crescimento da criança, dentro do seu processo de desenvolvimento como ser humano. Ou seja, as garatujas ou os rabiscos aparecem na fase sensório-motora, etapa da teoria do desenvolvimento humano desenvolvida pelo estudioso Jean Piaget, onde a criança explora materiais e movimentos, não na fase pré-operatória, onde a criança começa a construir e a representar.
O desenho infantil é um parâmetro de análise importante o progresso da criança. O seu desenvolvimento contribui a representação simbólica, para o desenvolvimento motor, emocional e conseqüentemente, para a alfabetização.
Observou-se na construção desse artigo que a bibliografia sobre o assunto é restrita, principalmente no âmbito educacional. Foram encontrados poucos autores e estudos sobre o assunto. A bibliografia encontrada é em sua maioria de autores da década de 50 e 60, sendo os principais deles Luquet e Piaget . Diante deste fato é importante que novas pesquisas sobre o desenho infantil sejam realizadas com a finalidade de subsidiar o trabalho dos educadores, assim como ampliar as hipóteses sobre o assunto, a partir de novas descobertas.
A evolução do desenho infantil está diretamente relacionada a representação simbólica que se manifesta por volta dos dois anos de idade, na fase pré-operatória. Assim sendo, este processo é intrínseco ao desenvolvimento das estruturas cognitivas e motoras necessárias à alfabetização e que são desenvolvidas pela interação entre a criança e o objeto. São essas interações que privilegiam a capacidade da criança representar e interpretar.
Diante disso é possível dizer que o desenho é precedente a escrita, mas que os dois possuem uma relação de interdependência, pois quanto mais oportunidades as crianças tiverem de representar e transcrever para o papel toda a sua impressão sobre o mundo que a rodeia, seus sentimentos, emoções etc, mais ela estará preparada para se apropriar do sistema de escrita, visto que o mesmo, assim como o desenho, também é uma forma de representação.
Educadores e pais devem oportunizar às crianças momentos significativos de interação, dentre as quais as atividades lúdicas tem um papel fundamental. O desenho, como uma atividade lúdica, é um dos principais exemplos. Podemos ainda citar o brincar, os jogos e as dramatizações, todos contribuintes para o desenvolvimento da representação simbólica.

Referências Bibliográficas
FERREIRO, Emília, TEBEROSKY, Ana. Psicogênese da Língua Escrita. Trad. Diana Myriam Lichtenstein, Liana Di Marco e Mário Corso. Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 1999.
GARDNER,Howard.Arte, Mente e Cerébro: uma abordagem cognitiva da criatividade. Tradução: Sandra Costa. Porto Alegre:Artes Médicas Sul, 1999.
LUQUET, G. H. O desenho infantil. Porto: Editora do Minho, 1969.
LUQUET, G.H. Arte Infantil. Lisboa: Companhia Editora do Minho, 1969.
MÈREDIEU, F. O desenho infantil. São Paulo: Cultrix, 1995.
PIAGET, J. A formação dos símbolo na criança. PUF, 1948
PILLAR, Analice Dutra. Desenho & escrita como sistema de representação. Porto Alegre: Artes Médicas, 1996.
RABELLO, Sylvio. Psicologia do Desenho Infantil. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1935.



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